Com pouco mais de um mês no ar já é possível observar quais são os maiores acertos e os maiores deslizes na novela de Walcyr Carrasco.
Se num primeiro momento a língua ferina e a ironia escrachada do vilão Félix conquistaram os telespectadores logo de cara, aos poucos estas mesmas características acabaram exagerando um pouco demais o tempero da história. Ou salgando a Santa Ceia. Como o próprio vilão costuma dizer. A disposição para o assassinato da vilania nas telenovelas é um recurso que precisa ganhar claras causas e razões muito bem construídas para ocorrer.
Neste sentido, não existem muitas diferenças entre as seringadas fajutas da Lívia (na novela “Salve Jorge”) ou os “empurrões rocambolescos” de Tereza Cristina na escadaria de “Fina Estampa”.
Se Félix já soava bastante contraditório pelo fato de querer roubar a empresa do próprio pai (do qual ele é herdeiro direto), o fato de o vilão querer eliminar sua própria sobrinha visando obter a direção do hospital não soa também muito crível. Porque não eliminar logo a própria irmã e herdeira natural de todo o hospital? Não ajudam também os fatos do vilão ter uma inteligência emocional de uma criança de dez anos, ter uma interpretação hiperbólica do ator Mateus Solano ou um texto caricatural do novelista Walcyr Carrasco.
Como bem observou o humorista José Simão, o vilão Félix nada mais é que o resultado do arsenal esgotado da Rede Globo em produzir vilãs. Assim então se produz um vilão “bicha má” de ambição desmedida e de impulsos homoafetivos refreados para despertar as “paixões” dos telespectadores (no sentido filosófico do termo).
E talvez seja justamente nesse jogo de indiretas e tensões homoafetivas que residam algumas das maiores virtudes do personagem: as sugestivas cenas de Félix com o médico Jacques (Júlio Rocha) são um dos pontos mais autênticos da história. Por outro lado nada muito diferente também: já vimos diversas vezes vilãs adotarem utópicos objetos sexuais e em diversas novelas.
E após este Show do Felix, o que resta na história de “Amor À Vida” ?
Se na cena protagonista da história temos um dos triângulos amorosos mais mornos da história recente das telenovelas por outro lado podemos contar com subtramas muito bem conduzidas além de performances memoráveis de diversos atores.
A estreia de Tata Werneck na Rede Globo foi de encontro ao papel de uma das periguetes mais grandiloquentes que se tem notícia. E nesse sentido o metro e meio da atriz não impede que o alvo da personagem seja os grandes astros do esporte e da música no Brasil. É quase como o periguetismo em toda essência do neologismo: se a idéia é a mulher na sua plena liberdade sexual porque não mirar no milionário pai do David Lucas ou no sedutor e divorciado jogador do Corinthians?
Apesar da velocidade frenética com que os plots da novela são propostos e logo em seguida resolvidos (como o fato da protagonista Paloma ter encontrado sua filha logo no primeiro mês de novela) a cíclica em torno da personagem de Tatá Werneck, a Valdirene, parece ter parado no tempo quando o assunto é a jornada do herói de Joseph Campbell: após sair derrotada de mais um dos seus flertes sexuais Valdirene já logo começa a cogitar um novo pretende famoso e rico pra poder laçar. Essa demora pela transformação da personagem é algo que já cansa um pouco e poderia ter sido antecipada um bocado.
Outros coadjuvantes de luxo na trama são o casal gay da história, o Niko (Thiago Fragoso) e o Erom (Marcello Antony) que apesar de apresentarem um contraponto batido na questão do homossexualismo em relação ao Félix (de que o homossexual assumido é mais feliz), têm a vantagem de trazer à tona a questão da família constituída por um casal homossexual.
Se o tabu do beijo gay for quebrado através destes dois personagens, a causa GLS pode estar muito bem representada.
Outros destaques da trama são Bruna Linzmeyer muito crível no difícil papel de uma autista e também a atriz (e humorista) Fabiana Karla figura conhecida pela comédia rasgada do “Zorra Total” e agora no divertido papel de uma virgem balzaquiana desesperada.
Muito diferente das tórridas repetições do hesitante casal Michel (Caio Castro) e Patrícia (Maria Casadevall) a casta personagem Perséfone (Fabiana Karla) funciona perfeitamente dentro das expectativas do que se espera dela na trama.
Já o trio principal da novela além de ser plateia no show do vilão protagonista, esboça uma tentativa extremamente sem graça de triângulo amoroso. E Ninho é de longe o vértice mais chato desta relação triangular. Além de ser o papel mais descartável do Juliano Cazarré em suas telenovelas recentes. Saudades do Adauto.
À todos aqueles que inicialmente encheram a boca por comparações proféticas da história de Walcyr Carrasco com “Avenida Brasil” as expectativas foram em vão.
A figura de um vilão impactante e da gênese do conflito da historia com uma criança arremessada ao lixo não foram fatores suficientes para maiores analogias com a consagrada história de João Emanuel Carneiro. Mas foram suficientes para nos tentar fazer esquecer rapidamente das seringas descartáveis de Lívia, na novela de Glória Perez.
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