Se você digitar as palavras “crise” e “Hollywood” em qualquer site de buscas na internet, vai receber como resultado inúmeras entradas para matérias de grandes portais e pequenos blogs avaliando a crise criativa que se abateu sobre os estúdios americanos na última década. Apoiando-se nas muletas dos reboots e remakes, os estúdios de Hollywood têm decepcionado até os mais aficionados cinéfilos. E é só bater o olho nas principais estréias para perceber a razão. A quantidade de adaptações de livros questionáveis, filmes baseados em super-heróis e até filmes que muita gente duvidava que tivesse fôlego para ganhar uma seqüência já são uma trilogia, quadrilogia e por aí vai. Outro fato desanimador: os últimos atores a serem premiados no Oscar tiveram performances maiores que os filmes que estrelavam. O talento monstruoso do irlandês Daniel Day-Lewis pôs em xeque um boçal e modorrento filme cujo protagonista era o aclamado presidente norte-americano Abraham Lincoln. O intérprete irlandês carregou o filme nas costas do início ao fim e não à toa foi pela 3ª vez consagrado com o Oscar de melhor ator. Terceira vez. Um número recorde não visto anteriormente na história da premiação. Já a atriz Jennifer Lawrence embolsou a estatueta de melhor atriz pelo manjado drama “O Lado Bom da Vida” cujo desfecho é tão previsível quanto os “booms” onomatopéicos do próximo trabalho do diretor Michael Bay.
É unânime entre os especialistas do entretenimento: há um bom tempo Hollywood não tem nenhuma boa novidade. Se o “grande écran” passa por essa fase negativa, o oposto parece acontecer em relação à telinha da TV.
Cada vez mais diretores consagrados, atores e roteiristas do cinema vêm migrando para trabalhos televisivos, o que vem resultando no aumento da qualidade técnica das produções dramatúrgicas na TV.
Um dos recentes seriados a trazer certo frescor para o velho tubo de elétrons televisivo foi Boardwalk Empire, história policial que traz a ágil linguagem do diretor Martin Scorsese ao contar a história da máfia das bebidas alcoólicas durante a Lei Seca nos Estados Unidos (período que contribuiu para a antologia da lenda de Al Capone e ajudou a consolidar outros personagens no imaginário popular norte-americano). Outro programa quase hors-councours que é produto deste salto de qualidade da TV é Mad Men. O seriado narra o cotidiano da agência de publicidade americana Sterling Cooper durante a década de 1950 e oferece para o público a oportunidade de refletir sobre os conflitos éticos e morais da publicidade (em sua fase digamos mais embrionária). No Brasil, esta bola também vem sendo cantada há anos pelo seriado “A Grande Família”: qual a razão de se pagar por bilhetes de cinema que dão direito aos pastelões de Ingrid Guimarães e Bruno Mazzeo quando se tem toda quinta-feira à noite e de graça (olha que maravilha!) um roteiro e uma direção muito melhores?
Orçamentos impensáveis para produções de TV, agora já começam a ser cogitados, como foi o caso de The Pacific (2010), a série de guerra da dupla criativa Steven Spielberg e Tom Hanks (responsáveis pela antológica “Band of Brothers”) que contou com um “budget” cinematográfico de R$ 200 milhões, o maior já gasto em um seriado.
Isto sem mencionar outras séries que vem fazendo bastante barulho junto à crítica e ao público como Modern Family, Homeland, Justified, The Walking Dead, entre outras.
“A TV hoje é mais interessante do que o cinema” foram as palavras do cineasta brasileiro Fernando Meirelles em recente entrevista ao jornal Folha de São Paulo. Sua produtora, O2 Filmes, cabe lembrar, foi cinco vezes indicada ao Oscar e isto não parece ter impedido sua equipe de enveredar-se pelas telas da TV. Recentemente, a “O2 Filmes” estreou dois projetos televisivos: “Os Contos de Edgar” no canal por assinatura Fox (uma adaptação dos contos de mistério de Edgar Allan Poe) e o mosaico documental “A Verdade de Cada Um” no canal pago Natgeo.
Existe uma trivial questão também que resume esta migração da qualidade audiovisual para a TV e ela se chama “emprego”. O trabalho na televisão é mais constante que o do cinema e isto têm chamado a atenção de profissionais que não encontram mais oportunidades de desempenharem suas profissões numa linguagem cinematográfica tão vazia de novas idéias e ainda assim tão caríssima e complexa de ser produzida. Tanto pela oportunidade de diretores e roteiristas aprofundarem suas histórias em dez ou mais episódios ao invés das duas horas que o cinema permite, quanto pela oportunidade de desenvolver produções tecnicamente impecáveis a custos antes inimagináveis a TV vem sendo a válvula de escape de profissionais que querem encontrar espaço para desenvolverem seu trabalho.
Com a popularização da internet e o maior acesso à informação, o público dos seriados hoje não é o mesmo das sitcoms inocentes e das novelas regadas a drama das décadas passadas. O público hoje, mais bem informado, aceita muito bem o conteúdo forte e reflexivo que essas novas séries têm a oferecer e pelo que tudo indica, quem ganha é o próprio público. O espectador hoje, se tornou um especialista em linguagem audiovisual.
Até mesmo as séries feitas para a internet vêm ganhando cada vez mais qualidade técnica para conquistar o espaço e o público que este terceiro écran hoje ambiciona.
Os produtores brasileiros ainda estão acordando aos poucos para essa nova realidade que a TV oferece. Com a lei da TV Paga de 2011, que busca incentivar a produção de conteúdo brasileiro para a TV fechada, o mercado nacional de seriados não só aumentou em quantidade, mas também em qualidade. Além das produções recentes da “O2 Filmes” podem ser citados o elogiado seriado “Sessão de Terapia”, dirigido por Selton Mello para o canal GNT (que já foi renovado para uma segunda temporada) e a dramática e ótima “Copa Hotel”, também do mesmo canal, que conta com alguns conhecidos rostos das telenovelas brasileiras.
Neste domingo o canal HBO (a empresa que nos últimos quinze anos deu inveja a muita produtora de cinema de Hollywood) encerrará a terceira temporada de Game of Thrones, baseada na série de livros épicos de George R.R . Martin.
Esta outra pérola da HBO usa a fantasia medieval para divulgar a arquetípica questão de disputa pelo poder, tudo recheado por um conteúdo sexual bastante picante.
E é com uma capciosa pergunta sobre este “jogo dos tronos” que concluímos nosso pensamento:
Quem detém a majestade para poder sentar-se no trono do audiovisual hoje? A televisão ou o cinema?
(Texto de Marcela Faysal e Fernando Berenguel)
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